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Ontem, o Brasil perdeu mais do que um educador: perdeu um farol. O Professor Rodolfo Pinto da Luz, ex-reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, partiu para o Oriente eterno – como dizem os que cultivam valores perenes – deixando um vazio imenso entre aqueles que ainda acreditam na missão transformadora da universidade pública — e deixando também um legado que não se apaga, porque é feito de exemplo, de valores e de retidão.
Por três mandatos (1984–1988, 1996–2000 e 2000–2004), conduziu a UFSC com autoridade serena e sabedoria rara. Sob sua liderança, a universidade alcançou um patamar de excelência em pesquisa, ensino e extensão. Mais do que índices e rankings, o que se via era uma universidade viva, respeitada, humana. O campus era limpo, bem cuidado, seguro, e pulsava com liberdade intelectual genuína. O contraditório não era temido — era valorizado. Mesmo nos momentos mais tensos da vida nacional, jamais permitiu que a universidade fosse reduzida a palanque ou trincheira. Defendia ideias, mas acima de tudo, defendia o direito de cada um tê-las.
Homem de visão e equilíbrio, levou sua experiência para o cenário nacional, ocupando com mérito os cargos de Secretário de Educação Superior do MEC, Secretário-Executivo do Ministério da Educação e, interinamente, o próprio cargo de Ministro da Educação. Foi presidente da CAPES e da ANDIFES. E em cada um desses papéis, fez o que sempre soube fazer: construir pontes, valorizar a formação, promover o mérito com justiça. Jamais buscou aplausos fáceis. Sua atuação era discreta, firme e profundamente comprometida com o bem público.
Em Florianópolis, sua contribuição foi igualmente marcante. Como Secretário Municipal de Educação por mais de uma década, implementou políticas transformadoras, aliando cultura, planejamento e ensino com resultados concretos. Criou o Sistema Municipal de Cultura, presidiu a Fundação Catarinense de Cultura e o IPUF, e deixou como marca o respeito ao servidor, o estímulo à criatividade e o investimento no futuro das crianças e jovens.
Na UFSC, promoveu a internacionalização do corpo docente, incentivou a especialização no Brasil e no exterior e nunca impediu que professores servissem ao país em outras esferas. Pelo contrário: compreendia que a universidade devia ser parte da sociedade, e não um mundo à parte. Foi pioneiro na implantação da educação a distância, introduziu inovações tecnológicas quando o país ainda engatinhava no digital, criou centros, laboratórios e ampliou expressivamente a pós-graduação. Sua UFSC era moderna, acolhedora, eficiente.
Rodolfo era, acima de tudo, um humanista. Não um humanista de discurso — mas de prática. Era chamado, com justiça, de “o homem do diálogo”. Sabia ouvir, sabia ponderar, sabia decidir. E decidia com coragem, sem humilhar, sem emparedar. Sua autoridade vinha do respeito que impunha naturalmente, pela integridade com que conduzia cada gesto, cada escolha, cada palavra.
Por isso, a comparação com o presente é inevitável — e dolorosa. Hoje, muitas universidades públicas parecem ter renegado seu papel formador. Transformaram-se em redutos ideológicos, onde a liberdade virou palavra de efeito e o pensamento divergente é silenciado com desprezo. O passado é apagado, o contraditório é perseguido, e até a presença da polícia para garantir segurança é rejeitada. Campi vandalizados, prédios abandonados, alunos e professores amedrontados ou calados. Um cenário que Rodolfo, com certeza, não aceitaria. Ele compreendia que a universidade não é propriedade de grupos, mas patrimônio da sociedade. E que a verdadeira liberdade acadêmica só existe quando há responsabilidade, civilidade e abertura real ao debate.
Hoje, como articulista — mas também como amigo e irmão —, escrevo estas linhas com a alma tocada. A dor é funda, porque sua ausência será sentida em cada sala, em cada biblioteca, em cada decisão que exija coragem e clareza. Mas a gratidão é ainda maior. Porque Rodolfo Pinto da Luz foi o tipo de homem que ilumina enquanto vive — e que continua iluminando depois que parte.
Magnífico foi o seu título. Mas mais magnífico ainda foi o ser humano que habitava aquele título. Um homem digno, sereno, justo. Um verdadeiro educador, no sentido mais elevado da palavra. Descanse em paz, querido Rodolfo. Sua luz permanece entre nós. E onde houver uma universidade que ainda ousa sonhar, seu nome será lembrado com respeito e esperança.